sexta-feira, 23 de maio de 2014

Biblioburro leva livros aos povoados perdidos da Colômbia

 Luis Soriano quis dividir seus livros com as crianças de aldeias sem acesso à leitura

reprodução
reprodução
O colombiano Luis Soriano leva livros às aldeias e povoados nas costas de seus burros, Alfa e Beto
“Se eles não têm biblioteca, temos que inventar uma”. Com essa motivação o colombiano Luis Soriano começou a levar livros aos povoados de seu país onde as crianças não têm acesso a livros. O meio de transporte é a força dos burros Alfa e Beto.
A iniciativa recebeu o nome de Biblioburro, e foi narrada ludicamente pela escritora Jeanette Winter, em um livro ilustrado cheio de cores e imaginação.
reprodução
reprodução
A escritora Jeanette Winter relatou a história do Biblioburro

domingo, 4 de maio de 2014


O texto na era digital

Para além do internetês, a internet está mudando a maneira como lemos e escrevemos

Edgard Murano

Na ponta do lápis: escrever tornou-se uma atividade mais banal depois da internet, consequência de blogs, e-mails e redes sociais
Houve um tempo em que o hábito de manter cadernos de anotações era algo bastante corriqueiro. Os chamados de "livros de lugares-comuns" (ou commonplace books ) eram utilizados pelos leitores para o registro de trechos e passagens interessantes com que se deparavam em suas leituras. Mas além de transcrições, esses cadernos também reuniam apontamentos sobre a vida cotidiana, conforme relata o historiador Robert Darnton em A Questão dos Livros (Cia. das Letras, 2009, p.164). Essas informações eram grupadas e reorganizadas à medida que novos excertos iam sendo acrescidos. O hábito espalhou-se por toda a Inglaterra no início da era Moderna, e muitos escritores famosos - entre eles John Milton e Francis Bacon - cultivaram essa maneira especial de absorver a palavra impressa, fundada na não linearidade e na fragmentação da informação.

Tradição viva
Hoje, com mais de 37 milhões de usuários de internet só no Brasil, essa tradição de escrita parece mais viva do que nunca, impulsionada por novas tecnologias e amplificada pela comunicação em rede. Não é exagero afirmar que e-mails, blogs e redes de relacionamento já deixaram sua marca na produção textual contemporânea. Para o escritor Michel Laub, autor dos romances O Gato Diz Adeus e Longe da Água (ambos pela Cia. das Letras), a internet tornou os textos mais naturais e coloquiais, embora não seja a única responsável por essas mudanças.

- O texto da internet é um texto em geral mais coloquial, menos "literário", no sentido de ser mediado por truques de estilo. A internet não inventou a coloquialidade, mas fez com que ela passasse a soar mais natural para muito mais gente e, estatisticamente ao menos, virou um certo padrão - afirma.

Com cada vez mais usuários - o acesso à rede no Brasil aumentou 35% entre 2008 e 2009 - a internet está criando novos hábitos de comunicação entre as pessoas, que acabam se adaptando às facilidades da nova tecnologia. Isso vale tanto para a leitura, em vista da profusão de textos veiculados na rede, quanto para a escrita, principal meio de expressão do internauta (pelo menos até que as conversas "via voz" se tornem mais corriqueiras).

Superficialidade
Há quem veja nessa torrente de informações que jorra na internet um fator negativo, dificultando nossa concentração em textos de fôlego como romances, por exemplo. Em artigo controverso publicado na revista The Atlantic em 2008, intitulado "O Google Está nos Deixando Idiotas?", o crítico de tecnologia Nicholas Carr defende a tese de que a navegação na internet está interferindo em nossa capacidade de leitura. Se antes, afirma Carr, ele se sentia um "mergulhador num oceano de palavras", hoje ele literalmente se sente "esquiando nesse oceano", dando a entender que a experiência de ler proporcionada pela internet é bastante superficial.

Por falar em imersão, para Roseli Deieno Braff, supervisora de língua portuguesa da editora COC, essa geração que já nasceu imersa na tecnologia não possui carência de informações, pois está sempre conectada. Porém falta muitas vezes a capacidade de se aprofundar mais no que leem e, consequentemente, de separar o joio do trigo. 

- Não falta informação para esses jovens, mas muitas vezes falta a capacidade de processar e refletir sobre tudo o que leem. Ansiosos e inquietos, consideram uma tarefa muito difícil ler um livro de cem páginas. Nesse sentido, a ausência de concentração torna-se muito negativa, obstáculo inclusive para a resolução dos problemas que a vida certamente vai oferecer - afirma Roseli.

Ainda que o processo de reflexão não esteja acompanhando o ritmo acelerado com que esta geração vem consumindo informações, a professora de português Rosangela Cremaschi, do curso de Comunicação Escrita da FAAP, acredita que a diversidade de códigos e linguagens tem deixado os jovens mais atentos e receptivos.

- A internet deixou o leitor mais receptivo e participativo, pois recebe informações em diferentes linguagens e por meio de leituras não lineares. O texto até então "sagrado" se torna mais acessível. Se antes o ato de ler era algo distante, a internet acabou com isso, o que é positivo - defende Rosangela.

O escritor Michel Laub também vê com bons olhos os novos hábitos de leitura incutidos pela tecnologia. Para ele, a propensão a textos mais curtos em sites e blogs não nos tornou necessariamente mais dispersos ou desatentos. Ao contrário: lê-se mais do que antigamente.

- Os que leem textos mais longos e difíceis são uma minoria como sempre foram. Mas o restante das pessoas, que há uma década não lia nada, hoje trabalha com o texto escrito boa parte do tempo, e isso cria um certo hábito de leitura, mesmo que diluído - afirma.

O historiador Robert Darnton: a leitura e a escrita fragmentadas tiveram precedentes na era Moderna

Mais leitores

Não por acaso, segundo a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro na última década, o Brasil saltou de 26 para 66,5 milhões de leitores no que diz respeito a livros impressos. Esses números por si só já desfazem qualquer "má" influência da internet sobre os hábitos de leitura do brasileiro.

- A internet não deve ser vista como algo negativo, pois amplia nossas possibilidades de leitura. É claro que é preciso um olhar crítico, e este é o papel do educador, o de orientar a busca, seleção e gerenciamento das informações que estão disponíveis na rede - afirma Valéria Caratti, consultora do portal Planeta Educação.

Não só a leitura como também a escrita foram favorecidas pela explosão da comunicação na internet observada na última década, que proporcionou um contato maior das pessoas com atividades que envolvam a escrita - como deixar um recado na página de um amigo, escrever um e-mail ou postar textos num blog. Também é inegável que sites de relacionamento - como Orkut, Twitter e Facebook, só para citar os mais conhecidos - tornaram o ato de escrever mais banal e cotidiano, sem nenhum prejuízo nisto, uma vez que a escrita elaborada deixou de ser algo exclusivo de escritores e das atividades escolares.

Os números atestam a presença incontornável das redes sociais no dia a dia das pessoas. Segundo uma pesquisa realizada pela empresa Hitwise Serasa Experian, essas redes são responsáveis por 62% do tráfego de internet no Brasil. Em julho de 2009, 21,4 milhões de pessoas usaram algum tipo de rede social no país, isto é, cerca de 83% dos internautas residenciais, de acordo com o Ibope Nielsen Online.

O que já havia sido deflagrado nos anos 90 pela comunicação via e-mail, mensageiros eletrônicos e pela cultura escrita dos blogs, as redes sociais elevaram à enésima potência ao garantir interatividade e visibilidade às pessoas em torno de interesses em comum. O próprio microblog Twitter, intensamente debatido na mídia por sua contribuição à concisão (ver a matéria " O que é possível dizer em 140 caracteres? ", Língua 54), de certa forma cristalizou uma tendência a textos enxutos.  Gêneros de texto como o aforisma, o haicai e o epigrama, entre outras formas breves, encontram no Twitter o suporte ideal.

Para além dos modismos que nascem e morrem na grande rede mundial de computadores, o advento do microblog Twitter extrapolou essa esfera para cair na boca de grandes homens de letras, muitas vezes avessos a novidades tecnológicas, como o escritor José Saramago, que chegou a declarar: "Os tais 140 caracteres reflectem algo que já conhecíamos: a tendência para o monossílabo como forma de comunicação. De degrau em degrau, vamos descendo até o grunhido". Por mais que autores torcessem o nariz para a ferramenta, muitos deles aderiram, dando corpo ao que se chamou de "tuiteratura". No Brasil, escritores como Fabrício Carpinejar, Marcelino Freire, Carlos Seabra, entre muitos outros, aderiram ao novo gênero, emprestando-lhe uma dicção própria.

Para o escritor Michel Laub, a internet tornou os textos mais naturais e coloquiais

Coexistência

Essa diversidade estilística introduzida na literatura pelo texto praticado na internet, com suas formas mais soltas e coloquiais, criou dois caminhos possíveis para escritores, afirma Michel Laub. Ele argumenta que, por um lado, parte dos leitores ficaram mais impacientes com a prosa de feições literárias - mais lentas, de vocabulário mais amplo, verbos no mais-que-perfeito etc. - ao passo que outros leitores passaram a valorizar ainda mais esse tipo de escrita, justamente pela superexposição a textos mais simples encontrados na internet. No entanto, o escritor acredita que essas duas vertentes de prosa podem coexistir.

- Sempre é possível a diversidade na literatura. Cito dois exemplos de autores que escreviam assim muito antes da internet: William Faulkner, mais "oral", e Marcel Proust, mais "literário" - explica Laub.

Para Roseli, no entanto, os resultados dessa coexistência são variáveis, com resultados nem sempre positivos.

- Do mesmo modo que a oralidade intervém na norma culta do idioma, e que foi uma das bandeiras dos modernistas brasileiros na Semana de 1922, a linguagem "ligeira", às vezes cifrada e só para iniciados, também afeta a modalidade culta, e o resultado nem sempre é positivo - afirma.

Anos antes de o microblog cair na preferência de internautas no mundo inteiro, os blogs já ocupavam um lugar privilegiado na internet, que pela primeira vez oferecia aos usuários a possibilidade de escrever, editar e publicar seus próprios textos.

- O espaço reduzidíssimo do Twitter opõe-se ao blog, este sim uma ferramenta capaz de abrigar fotos, textos próprios ou alheios, comentários, tudo organizado em forma de mural ou diário eletrônico, utilíssimo para desenvolver nos estudantes as habilidades de leitura e escrita - explica a professora Roseli.

A partir daí, navegar pela internet deixou de ser um ato solitário, em que o usuário apenas entrava nas páginas e lia seus conteúdos. Com os recursos de interação cada vez mais expandidos, qualquer site é um convite a comentários, críticas e observações, obrigando os internautas a desenvolverem discursos de improviso e a defender seus pontos de vistas. O Facebook, por exemplo, aprimorou as antigas listas de discussões e fóruns, acrescentando-lhes um visual mais limpo e elaborado, com diferentes graus de interação acompanhados de recursos audiovisuais, tornando a experiência de compartilhar informações ainda mais enriquecedora.

Embora não se possa afirmar categoricamente que a internet favoreceu o desenvolvimento de uma "cultura letrada", com ênfase em informações profundas e relevantes, ela reforçou o peso da palavra escrita no cotidiano das pessoas. Mais do que gírias e jargões, como o famigerado "internetês", as transformações pelas quais passam a escrita e a leitura estão por ser dimensionadas.

 


Gustavo Bernardo


Gustavo Bernardo é Doutor em Literatura Comparada, Professor Associado de Teoria da Literatura no Instituto de Letras da UERJ e pesquisador do CNPq. Publicou até hoje vários ensaios, entre eles A Educação pelo Argumento e O Livro da Metaficção, além de outros tantos romances, entre eles A filha do escritor e Monte Verità. Acaba de publicar, pela editora Rocco, o livro Conversas com um professor de literatura, contendo 50 crônicas publicadas nesta Revista Eletrônica do Vestibular da UERJ.

A leitura deve ser obrigatória?

Ano 4, n. 12, 2011

A importância da leitura parece incontestável. Ziraldo costuma repetir que ler é melhor do que estudar. Como professor, concordo com ele. Estudar muito não leva necessariamente ao hábito da leitura, e pior, não leva necessariamente a bons resultados nas provas e nos concursos. Em contrapartida, o hábito da leitura ajuda muito tanto a estudar quanto a ter bom desempenho nos testes de avaliação, justo porque grande parte desse desempenho depende de saber ler os textos e os enunciados das questões.
Estudar muito, de maneira mecânica e acrítica, na melhor das hipóteses prepara o aluno para a própria escola, deixando-o despreparado para a vida e para o trabalho fora da escola. Quem lê bastante, no entanto, escolhe suas leituras e assim aprende tanto a escolher quanto a pensar, habilitando-se a resolver qualquer problema que a vida ponha na sua frente, quer na escola quer fora da escola.
Quem lê muito não costuma discriminar gêneros, “traçando” desde bula de remédio até poesia e romance, sem deixar de passar pelas histórias em quadrinhos e pelas notícias de jornal. A leitura de textos literários mostra-se especialmente refinada, porque sempre leva o leitor a acompanhar os acontecimentos narrados por outra perspectiva que não a sua: ou a do narrador ou a do protagonista. A habilidade de ver as coisas por uma perspectiva diferente da sua é fundamental para resolver quaisquer dilemas que se apresentem em casa, na sala de aula, na rua, no laboratório, no escritório ou no palácio do governo. Essa habilidade se aprende e se estimula com a leitura de ficção.
Estas considerações podem levar o leitor mais apressado a concluir que a leitura na escola deve ser totalmente livre e voluntária. Como já chamei esse leitor de “apressado”, os demais, bons leitores, perceberam que não concordo com a conclusão. Nos anos 70 do século passado, defendeu-se a leitura por prazer: os alunos só deveriam ler o que gostassem. Hoje em dia, para tantos adolescentes isso significaria ler apenas mensagens de twitter. Na verdade, a escola deve sim encontrar várias formas de promover o hábito da leitura, mas sem abdicar de indicar regularmente algumas leituras obrigatórias.
A oposição “prazer X obrigação” é improdutiva. Primeiro, porque a escola não é um lugar natural de prazer; não há como a escola competir com a praia, por exemplo. Convenhamos, a praia é bem mais agradável. Segundo, porque a liberdade absoluta não leva ao prazer, mas sim à inércia, ou pior, ao terror. Como disse um escritor, “todo prazer viceja à sombra da dor”, vale reconhecer, da luta, da dificuldade, da superação, da conquista. Terceiro, porque o professor deve ele mesmo conquistar o aluno para o livro, o que não fará se deixá-lo à mercê da própria vontade. O professor conquista o aluno quando o provoca, quando o desafia, principalmente quando não se demite do seu lugar de professor.
Logo escuto a contestação: mas muitas aulas de literatura fazem com que o aluno passe a detestar literatura! Admito. Entretanto, isso acontece não porque as leituras que o professor passe sejam obrigatórias, e sim porque o próprio professor não transmite o mínimo entusiasmo com os livros indicados, em alguns casos extremos nem leu o que indicou. O único método de educação que presta, já escrevi isto um milhão de vezes, é o do exemplo. Só ensina a ler quem lê muito e mostra que lê muito.
O professor que manda ler mas ele mesmo não lê há muito tempo ensina tão somente o seu próprio desapreço pela leitura. O professor que manda ler textos literários mas só admite a sua própria leitura e interpretação ainda não entendeu que a literatura é por definição plurissignificativa, admitindo múltiplas perspectivas. O professor que é também um leitor entusiasmado estimula no aluno a reflexão e o questionamento sobre o que lê, ou seja, estimula no aluno o refinamento da sua própria perspectiva.
Não é obrigatório que o aluno ao final goste da leitura obrigatória, mas sim que goste da reflexão, da discussão, do debate, da provocação. Um dos melhores elogios que recebi foi quando, décadas atrás, adotei "Lucíola" no ensino médio e um aluno me disse depois que continuava “odiando” José de Alencar mas tinha “adorado” as aulas, justamente por causa das discussões.
Em resumo: a leitura obrigatória é obrigatória sim, desde que o professor mostre seu entusiasmo com as leituras que indica. A leitura literária deve ser tratada como tal, explorando sempre sua capacidade de nos permitir ver pela perspectiva do outro. A leitura obrigatória deve ser acompanhada de outras formas de estímulo à leitura, a serem inventadas pelo professor e pelos alunos.

Atenção:
  • Esta é uma área voltada ao visitante da Revista Online do Vestibular Uerj e tem como objetivo promover a interatividade entre a Revista e seus leitores de maneira ágil e aberta, prezando sempre pela integridade moral de terceiros.
  • Todos os comentários feitos são submetidos à moderação da nossa redação e são limitados a 500 caracteres.
  • As opiniões expressas nos comentários não representam a opinião do Vestibular Uerj.

Participe também do Projeto Leitura Compartilhada com sugestões e comentários...
Este projeto surgiu a partir da necessidade da elaboração do Projeto Interdisciplinar pelos alunos do 5º período do curso de Serviço Social. O objetivo principal é contribuir para o desenvolvimento pessoal, acadêmico e profissional dos alunos da Faculdade Novos Horizontes, Unidade Santo Agostinho.

A proposta é disponibilizar livros de diversos gêneros literários, que serão obtidos através de doações, disponibilizados em um stand que ficará na entrada da faculdade, no período de 19 a 28 de maio de 2014, para que todos possam acessar.

O diferencial dessa proposta é que para participar basta pegar um livro e deixar outro, o aluno poderá ficar o tempo que achar necessário. Se depois de pegar um livro concluir que não é do seu interesse basta trocar por outro.